31 outubro 2006

40. PARAÍSOS PERDIDOS E CANIVETES SUÍÇOS

Estes lugares mágicos, fins do mundo, off the beaten track, estes paraísos perdidos e sei lá que mais, são muitas vezes aqueles onde não se evita o encontro com outro turista. Num minúsculo ponto do mundo basta a presença simultânea de dois turista para que se cruzem, apanhem o mesmo transporte, fiquem alojados no mesmo estabelecimento, e para que dali sigam juntos rumo ao destino seguinte - o mesmo destino seguinte. Será fácil apostar que serão duas pessoas que, tendo em comum algo tão único (como o é mesmo par de coordenadas sobre o planeta terra) só se podem entender bem e partilhar o momento.

(Um aparte apenas para referir que de facto já experimentámos empatias assim especiais, das quais resultaram amizades com uma força particular tão diferente das amizades comuns, algumas, claro, com mais repercussões que outras.)

Mas tal aposta, se bem que fácil não é garantida e se, por uma qualquer razão, os dois turistas não se reverem um no outro, torna-se então difícil a partilha da solidão que se buscava o que consequentemente aumenta o desagrado pelo "invasor". Para não estragar mais o momento nem se procuram largas explicações para esta incompatibilidade e a questão reduz-se ao desejo de que este (des)encontro não seja o início de um trajecto sobreposto ou de vários cruzamentos por algures próximos.

A ilha de Likoma aparece no Lonely Planet como um destes lugares perdidos (mais um, apregoado pelo guia das viagens-a-conta-tostões mais vendido em todo o mundo) . Segundo esta publicação, o lago Malawi é um cut off from the outside world e o norte de Moçambique aparece como the least-explored area of the country and challenging to travel around. Ora aqui está já um trajecto bom para se intersectarem viajantes.

Cruzámo-nos com o casal suíço a bordo do ferry-boat Ilala. Dormimos no mesmo deck, saímos ambos para a pequena ilha de Likoma e acabámos todos instalados no Mango Drift (descobrindo mais tarde que íamos de seguida para a mesma direcção Moçambique).
E contra as probabilidades não nos entendemos. Ao principio, o ambiente foi de mera indiferença mas depois instalou-se uma certa antipatia. Felizmente, o desagrado que aquele casal (nome de código "Canivetes") provocou em nós foi recíproco mas e houve o mais pequeno confronto. Eu cá, achei de extremo mau gosto a postura deles em acampar por tuta e meia no Mango Drift, cozinhando as suas refeições e, simultaneamente, usufruindo do chuveiro, do autoclismo, dos óculos tubo e barbatanas de mergulho e da água fresca. (relembro que viajavam no Ilala em Primeira Classe Deck quando há por metade do preço a segunda classe e, ainda mais barata, a terceira.)
Enganam-se os Canivetes se pensam que é à conta de dois dólares (ou lá quanto foi que eles pagaram) por noite de campismo que o Mango Drift tem todas aquelas facilidades "urbano-europeias" na bonita praia à beira do Lago Malawi. Se todos só lá fossem acampar aposto que a gerência nem tinha conseguido comprar o jerican térmico onde os Canivetes tantas vezes encheram as suas garrafinhas de plástico.
Hoje, terça feira, quando saímos da ilha para embarcar de novo no Ilala eles ainda por lá ficaram. Apesar termos o plano de palmilhar exactamente os mesmos próximos destinos penso que assim nos afastámos o suficiente garantindo que não nos voltaremos a cruzar com eles.




Paraísos, baobabs, os canivetes suíços ainda no Ilala e mais uma fish-eagle africana

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