01 novembro 2006

41. AQUARIUS NATURALIS


Há muito que não calçava barbatanas ou colocava óculos de mergulho, e voltei a fazê-lo no lago Malawi, ou Niassa para os moçambicanos. O poupadinho beach resort Mango Drift, composto de oito cabanas de caniço e um bar-restaurante, faculta aos seus clientes este equipamento acompanhado de básicas instruções de mergulho e de um mapa da ilha de Likoma com os pontos ideais para snorkling.
Entrei na água como um pato desajeitado às arrecuas. Nesse dia, o vento tornou a ondulação na praia do Mango Drift considerável e, como consequência devido ao fundo arenoso, a água estava bastante turva. Enquanto nadava em direcção ao local indicado no mapa, a uns 50 metros da costa, mirava o fundo claro mas nebuloso com desconfiança."Isto não se vê puto", pensava eu. Gradualmente, a água foi-se tornando límpida e foi com surpresa e agrado que me vi rodeado de peixes sobre um fundo rochoso. Mergulhei várias vezes, não mais do que a 3 metros de profundidade, e observei duas espécies distintas, de tamanho e formas semelhantes, esguias entre 8 a 12 cm, contrastando nas cores. Uns eram algo transparentes, cor de palha com um brilho azulado; outros emanavam um azul forte com reflexos luminosos. De lá saí, feliz com esta singela experiência subaquática.
Foi só nesse dia à noite, em conversa ao jantar, que soube de ocasionais aparecimentos de crocodilos naquelas águas e mesmo de um ataque mortal a uma infeliz lavadeira de roupa ali bem perto. Estas revelações não me chocaram significativamente. Chocado fiquei sim, no dia seguinte e de novo a bordo do ferry-boat Ilala, quando me deparei com 15 caixas de esferovite, cada uma contendo 7 sacos de plástico e com o conteúdo desses sacos: os mesmos peixes que vi no lago, vivinhos da silva mas confinados a 50 centilitros de água. Desconheço da legalidade deste comércio e transporte. Se for irregulamentar, que este testemunho e as respectivas fotos, sirvam como denúncia e prova.
Seja como for, este episódio levou-me a reflectir sobre os aquários domésticos. Não cabe aqui avaliar do interesse (duvidoso) dos aquários de exibição pública que, a meu ver, caem na mesma categoria dos jardins zoológicos.
Sempre pensei que os peixes de aquário, de águas quentes e frias, eram espécies "de aquacultura", ou seja criadas, gerações sobre gerações, em aquários da especialidade, à semelhança dos periquitos ou dos canários. Inocentemente, pensava que o cativeiro lhes era intrínseco desde há dois ou três séculos quando o homem ocidental começou a capturar animais, para estudar sim, mas sobretudo para alegrar o ambiente dos mais influentes.
Esta captura, nos dias de hoje, enojou-me. Que me desculpem os justos que pagam pelos pecadores, mas sinto que no futuro deplorarei qualquer tanque de vidro com areia, luzinhas, e um motor eléctrico que, para nosso deleite visual, dê condições artificiais de vida a estes seres! Prefiro lembrar-me da ilha de Likoma.



no ferry-boat Ilala: 15 caixas x 7 sacos = muitos peixes "a caminho de aushwitz"

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